08 setiembre 2009

Barranquilla: A Historia dos B'ne Anussim de Portugal

A Historia dos B'ne Anussim de Portugal
de Feliciano Tavares da Silva Neto feleco - Tuesday, 8 September 2009, 04:37
 

História dos B'nê Anussim de Portugal

"De Ben Rosh à Beit Israel"

O movimento anussim (ou cripto-judeu) , nos anos 10 do século XX, recebeu o seu maior impulso com as pesquisas do engenheiro Samuel Schwarz, e com o início do trabalho de "resgate" por parte do capitão Artur Carlos de Barros Basto. O trabalho de ambos, se bem que separado no espaço e no tempo, é no entanto complementar. Schwarz, um engenheiro polaco contratado pelo governo republicano português, percorre várias povoações da zona raiana, interessado na história do judaísmo em Portugal. Confrontado com as enormes semelhanças entre a cultura judaica e a cultura daqueles a quem chamavam "marranos", Schwarz decidiu apresentar-se como judeu, mas não foi bem recebido. No entanto ao pronunciar a Shemá, a confissão de fé, em hebraico, idioma que os cripto-judeus nem sequer sabiam que existia, foi reconhecida a palavra Ad'nai (Senhor) e isso fez com que Samuel Schwarz passasse a ser aceite como correligionário. Recolheu então várias tradições orais e conseguiu reunir alguns livros manuscritos de orações. Com base nestas experiências publicou, em 1925, o livro intitulado Os Cristãos-Novos em Portugal no Século XX. Nele refere a intromissão de elementos católicos nos ritos judaicos e outras divergências em relação à ortodoxia.

Entretanto, e com o auxílio de círculos hebraicos do exterior, ia tomando corpo, na cidade do Porto, um activo movimento de integração dos cripto-judeus. O catalizador deste movimento foi o Capitão Artur Carlos de Barros Basto, um oficial do Exército Português, nascido em 1887, que se tinha brilhantemente distinguido durante a Grande Guerra nos campos da Flandres e recebido as mais altas condecorações nacionais e estrangeiras. Barros Basto vinha, por parte de seu pai, de uma família de cristãos-novos de Amarante. O seu avô era inclusivamente cripto-judeu praticante. No desejo de reverter à fé dos seus antepassados, Barros Basto apresentou-se um dia na sinagoga sefardita de Lisboa e declarou-se judeu. Não conseguiu contudo ser admitido na congregação. Aprendeu hebraico e deslocou-se a Marrocos para receber instrução religiosa. Em Tânger foi circuncidado e oficialmente aceite dentro da religião judaica, adoptando o nome de Abraham Israel Ben-Rosh. De regresso à cidade do Porto desenvolveu uma notável acção no sentido de defender os interesses da pequena comunidade israelita aí residente, umas dezessete famílias originárias da Europa Oriental. Foi devido aos seus esforços que se construiu uma sinagoga na cidade. Fundou também uma yeshivá, cujas actividades se iniciaram com cinco jovens vindos da zona fronteiriça. Ao longo de uns dez anos receberam aí instrução religiosa cerca de noventa adolescentes cripto-judeus. O programa da yeshivá incluía aulas de hebraico, português, francês, história judaica, teologia, apologética, homilética e liturgia cerimonial. No entanto nunca se conseguiu formar um único rabi e os alunos, regressados às suas terras de origem, em breve esqueceram os ensinamentos recebidos, tendo alguns mesmo chegado a manifestar sentimentos anti-semíticos. Barros Basto organizou também sessões de oração e esclarecimento em Belmonte, Covilhã, Bragança e outras localidades, sempre no seu afã de trazer "marranos" ao judaísmo oficial. A primeira "reconversão" teve lugar já em 1926 e foi seguida por algumas outras em anos subseqüentes. Em termos gerais, todavia, os cripto-judeus nunca se sentiram atraídos pela ortodoxia, cujo rigor repudiavam, e mantinham-se firmes na sua forma de culto, que consideravam como a única verdadeira.

Perseguido pelas suas convicções, sofrendo uma campanha que a Acção Católica lançou contra ele, Barros Basto acabou por ser julgado em conselho de guerra por actos atentatórios à moral. Esses actos tinham consistido em defender a prática da circuncisão para os criptojudeus que aceitassem a lei oficial. Também os seus acólitos sofreram perseguições, em alguns casos perderam os seus empregos e foram acusados de ligações com a Maçonaria. O movimento chegou a ser caracterizado como uma tentativa de descristianizaçã o por um jornal católico.

Apesar do intenso empenhamento de Barros Basto, todas as tentativas de "purificar" a fé dos criptojudeus falharam, devido não só a algumas discrepâncias entre os dirigentes da sinagoga do Porto e críticas vindas de círculos judaicos estrangeiros mas sobretudo em virtude do enorme arraigamento às tradições criadas pelos "marranos" no sistema de segredo e da profunda desconfiança em relação a contactos com elementos alheios ao grupo. Pelos fins da década de trinta os esforços nesse sentido foram abandonados.

O movimento anussim viu-se numa situação difícil nas décadas subseqüentes à morte do capitão Ben Rosh. O movimento recebe um novo sopro de vida nos anos 90 do séc. XX, quando a comunidade cripto-judaica de Belmonte é reconhecida. Em 1997, com o contributo da família Henriques, de Solomão Azulay e de Clara Mourão é construída de raiz a primeira sinagoga, em Belmonte, em oitocentos anos.

Entretanto, em Lisboa, descontentes com o facto de não serem admitidos na congregação ortodoxa (tal como Ben Rosh) os cripto-judeus da cidade decidem juntar-se à Associação da Juventude Israelita Hehaber que, embora ortodoxa, não lhes fecha as portas. Em 1999, já se contam nos órgãos sociais desta Associação cripto-judeus e, em 2004, estes são recebidos pelo Grão Rabino sefardita Shlomo Moshé Amar, aquando da sua deslocação a Lisboa para a celebração do centenário da Sinagoga Sharé Tikvá. Este encontro histórico constituiu o primeiro entre cripto-judeus portugueses e o Grão-Rabinato, em quinhentos anos. No entanto a demora do Grão Rabino em constituir um comité de avaliação da situação da comunidade levou a um desentendimento entre as partes.

Entretanto o Rabino Leo Abrami visita Lisboa e promete à comunidade um programa extenso e sério para que ela regresse de pleno direito ao judaísmo haláchico e ao seio da nação judaica. O movimento conservador, o segundo maior movimento judaico mundial, resolve apoiar a causa criptojudaica em Portugal. Em 2006, nasce, sob a orientação do Rabino Jules Harlow, a Kehilat Beit Israel, um espaço de tolerância e compreensão para judeus de todas origens. Desde então Lisboa tem uma Casa de Israel.

Fonte: http://www.beitisra el.org/?page_ id=5



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